Alienação parental diante da lei

Alienação parental diante da lei

A Lei nº 12.318/2010, em seu art. 2º estabelece o seguinte conceito: “Considera-se ato de alienação parental a interferência na formação psicológica da criança ou adolescente, promovida ou induzida por um dos genitores, pelos avós ou pelos que tenham a criança ou adolescente sob a autoridade, guarda ou vigilância, para que repudie genitor ou que cause prejuízo ao estabelecimento ou à manutenção de vínculos com este”, a partir desta análise há que ser entendida a alienação parental como um distúrbio psíquico grave que afeta o pai ou a mãe, vez que não aceitando o fim de um relacionamento (casamento ou união estável), é incapaz de dialogar de forma amadurecida, e utiliza os filhos como veículos de suas frustrações.
A psicanalista niteroiense Lenita Pacheco Lemos nos ensina que “…a prática da “alienação parental” pode ter origem em diversas causas, resultantes de distúrbios psíquicos, emocionais, relacionais, afetivos, entre outros, mas que não configuram uma doença propriamente dita, uma entidade nosológica que apresente características patológicas específicas.”

Vamos deixar claro que, a alienação parental não se verifica, tão somente, com a separação/divórcio dos genitores, podendo ocorrer, e também é muito comum, durante a constância do casamento/união estável, quando um dos genitores, seja por atitudes ou palavras, denigre, desqualifica, desautoriza o outro diante dos filhos, a ponto destes criarem uma falsa imagem do pai/mãe, como incapaz, inferior, desqualificado, alienado. São atitudes que se avolumam e acabam desaguando na separação/divórcio, e só aí tais atos se tornam do conhecimento geral, mas a
síndrome da alienação parental já está instalada.

Diversas condutas são tipificadas na lei de alienação parental, de forma
exemplificativa, conforme dispõe os incisos I a VII do parágrafo único do art. 2º, a
saber:

art. 2º….. Parágrafo único……
I – realizar campanha de desqualificação da conduta do genitor no exercício da
paternidade ou maternidade;
II – dificultar o exercício da autoridade parental;
III – dificultar contato de criança ou adolescente com genitor;
IV – dificultar o exercício do direito regulamentado de convivência familiar;
V – omitir deliberadamente a genitor informações pessoais relevantes sobre a
criança ou adolescente, inclusive escolares, médicas e alterações de endereço;
VI – apresentar falsa denúncia contra genitor, contra familiares deste ou contra avós,
para obstar ou dificultar a convivência deles com a criança ou adolescente;

VII – mudar o domicílio para local distante, sem justificativa, visando a dificultar a
convivência da criança ou adolescente com o outro genitor, com familiares deste ou
com avós.

Sem dúvida que, no exame de um caso concreto outras condutas podem ser entendidas como alienação parental, identificadas pelo magistrado com base em perícias interdisciplinares.
Com a Lei nº 13.058/2014, que regula o instituto da Guarda Compartilhada, passou a ser a regra, de forma que os pais, finda a conjugalidade, compartilhem de forma equânime, a convivência e todas as responsabilidades afetas à vida dos filhos menores, em igualdade de direitos e obrigações. Contudo, existem pais/mãe resistentes à sua aplicabilidade, se valendo de atitudes escusas, a fim de manipularem emocionalmente os filhos afastando-os do outro genitor não guardião, e de seus familiares, e, muitas das vezes, imputando condutas criminosas, como
agressões físicas/sexuais, com a finalidade de destruir, definitivamente, os vínculos parentais.

A incapacidade dos genitores de dialogarem a respeitos dos interesses dos filhos menores, dificulta o estabelecimento da guarda compartilhada, e abre as portas para a alienação parental, o que acarreta graves prejuízos psíquicos aos filhos.
É importante entendermos que a Síndrome de Alienação Parental (SAP) se instaura a partir do momento em que o menor passa a reproduzir as falas do alienador(a), atribuindo ao outro genitor (ou familiar deste) as supostas agressões físicas/sexuais.

O psiquiatra e pesquisador Richard A. Gardner foi o primeiro que conceituou a SAP e o fez da seguinte forma:

“A síndrome de alienação parental (SAP) é uma disfunção que surge primeiro no contexto das disputas de guarda. Sua primeira manifestação é a campanha que se faz para denegrir um dos pais, uma campanha sem nenhuma justificativa. É resultante da combinação de doutrinações programadas de um dos pais (lavagem cerebral) e as próprias contribuições da criança para a vilificação do pai alvo.”

Os malefícios da SAP afetam os menores em formação, trazendo sequelas desde a infância até a vida adulta, daí a necessidade de se reconhecer a prática da alienação parental, e estabelecer tratamento psicológico e psiquiátrico, para os infantes e também para os pais.

Como já dito a alienação parental impede uma convivência social e afetiva salutar da criança com o pai/a mãe e demais familiares, sendo equiparada pela lei ao abuso moral, desenvolvendo sentimentos negativos que lhes são passados pelo alienador(a), e o reflexo disto passa a ser observado desde a tenra idade pelo comportamento em casa e na escola, no convívio com os amigos, que vai da inibição demasiada, desatenção nas aulas, revolta, agressão, até a vida adulta, repetindo os mesmos erros do genitor alienador, se refugiando nas drogas,
cometendo ilícitos sociais, morais e criminais.

Em algumas vezes ao chegar na fase adulta, normalmente com o auxílio de terapeutas, psicólogos, passa a enxergar a verdadeira pessoa do pai/mãe alienado, e um sentimento misto de frustração e revolta tomam conta da pessoa, e às vezes ainda dá tempo de se reconciliar, mas em outras não mais.

A alienação parental dever ser analisada com muita cautela, pois estamos aqui falando do alienador, de quanto mal pode ser causado à criança, mas também ao alienado, porém, quando estivermos diante de caso que envolva agressão física/sexual é imprescindível a atuação de equipe interdisciplinar – assistentes sociais, psicólogos, psiquiatras, para apuração da realidade, pois as consequências são catastróficas para o menor, mas também para aquele a quem forem, falsamente, imputadas tais condutas. A sociedade não perdoa, ela julga e condena sem que os
fatos sejam devidamente apurados. O sensacionalismo fala mais alto e o prejuízo é irreversível.

O magistrado ao aplicar as sansões determinadas na lei penalizando o abuso de poder do guardião alienador, deve fazê-lo com critério, considerando que o caráter é mais pedagógico do que punitivo, mas é fundamental assegurar a convivência parental e restabelecer os laços afetivos da criança com o outro genitor e/ou seus familiares. O direito de convivência é da criança e também dos pais, e é garantia constitucional.

Existem Projetos de Leis do Senado para regular, normatizar e criminalizar e dar novos caminhos à alienação parental, tema complexo e polêmico, exigindo mais estudos e debates.

Bárbara Alcântara Augusto Pereira, advogada, professora universitária Ucam,
membro do IBDFAM – Instituto Brasileiro de Direito de Família
Instagram: @ucam.oficial

Alienação parental: os perigos emocionais para crianças e adolescentes

Alienação parental: os perigos emocionais para crianças e adolescentes

Para entender melhor os perigos emocionais da alienação parental é necessário compreendermos como se dá o desenvolvimento humano. Vygotsky (1930/1996) ressalta que através da aprendizagem e das interações dos agentes mediadores de cultura, (pais, professores, etc.) o sujeito que está em processo de aprendizagem se desenvolve pessoalmente.

Desenvolvimento cultural

desenvolvimento cultural da criança é caracterizada pela lei da dupla formação dos processos psicológicos superiores (desenvolvimento da linguagem, atenção, memoria, raciocínio, formação de conceitos…), tanto a nível interpsicológico quanto a nível intrapsicológico. Essa internalização é feita através das construções sócias e sua reconstrução individual, a interação da criança com os adultos e agentes mediadores concretiza a internalização (VYGOTSKY, 1930/1996).

Também, considerado o ambiente, mais crendo nas emoções e pensamentos, o cognitivismo considera que a noção de esquemas cognitivos é central para a terapia e a teoria cognitivas (Lopes, E., Lopes, R. & Lobato, 2006). A teoria considera que a personalidade é criada por valores centrais que se desenvolvem bem cedo na vida do
indivíduo como resultado da relação de determinismo recíproco entre ambiente, as características e o comportamento do indivíduo (Bandura, 1979).

A história de vida do indivíduo e suas características individuais criam os chamados esquemas cognitivos ainda bem cedo na vida, a relação com o ambiente através dos estímulos externos e internos são responsáveis pela criação das crenças que estabeleceram os valores individuais de cada um. Esse conjunto de fatores serão responsáveis pelo comportamento e emoções dos indivíduos ao longo da sua vida (Beck& Freeman, 1993).

Como podemos comprovar, mediante as afirmações dos teóricos aqui citados, o desenvolvimento do ser humano se dá através da sua interação com o meio ao seu redor, desenvolvendo sua subjetividade através das relações no meio em que vive. Esse desenvolvimento tem seu início já nos primeiros dias de vida quando o recém-nascido já começa sua interação com o mundo externo na relação com os pais, o amamentar, o carinho demonstrado através de beijos e abraços, as falas dos pais na manifestação de amor e cuidado.

Ao longo de seu crescimento essa criança irá se desenvolver dentro de um contexto social em que as figuras dos pais serão um referencial para sua vida até a fase adulta. Ainda na primeira infância, segunda a psicologia cognitiva comportamental, a criança irá desenvolver suas primeiras crenças nucleares que serão responsáveis por todo um esquema cognitivo que determinará seus comportamentos, emoções e reações fisiológicas ao logo de toda sua vida.
Portanto a figura dos pais é responsável pelo desenvolvimento da saúde mental de seus filhos. Quando essa figura, que deveria ser de cuidado e proteção, é denegrida os riscos de crianças e adolescentes desenvolverem crenças desequilibradas é alto.

Alienação parental

Quando um dos pais influencia o filho, criança ou adolescente, a repudiar o outro genitor, caracterizando assim a alienação parental, ele está desfazendo a figura referencial que essa criança ou adolescente tem, a figura do pai ou da mãe são referências para seu desenvolvimento, esse desenvolvimento pode ser saudável ou não dependendo de como será o ambiente.

É muito importante que as pessoas ao redor de crianças e adolescentes que estão passando por uma situação em que seja constatada a prática da alienação parental não fiquem de braços cruzados, é necessário que providencias sejam tomadas no intuito de preservar o desenvolvimento cognitivo e emocional dessa criança e adolescente, zelando assim por sua saúde mental.

Portanto sabedores da importância das figuras do pai e da mãe como referências do desenvolvimento de crianças e adolescentes, é de suma importância a preservação da imagem de cada um deles como símbolos de amor, proteção e valor. A alienação parental destrói esses valores sendo responsável pela criação de crenças desequilibradas geradoras de pensamentos mau adaptativos e consequentemente o aparecimento de transtornos psicológicos.

Glauber Mascarenhas psicólogo CRP 124752/06

“Não tenho medo, porque eu creio em Deus”

“Não tenho medo, porque eu creio em Deus”

A missionária Hilda Dias da Silveira, que atua na  ilha do Bananal, aldeia Macauba localizada em Tocantins/TO, compartilhou um pouco da experiência de atuar com crianças indígenas. 

Iniciei o trabalho na região no dia 20 de janeiro de 1983, pois ouvia muito sobre o trabalho ali e decidi ser missionária naquele lugar. A primeira dificuldade que enfrentei foi o desconhecimento da cultura, costumes e a língua do povo.

Hoje conhecendo mais do povo Carajás, da aldeia onde atuo, a dificuldade é a falta de missionários, visitas raras para ajudar no trabalho. Eles  são um povo que apreciam visitas.

O trabalho com as crianças

O trabalho com as crianças têm bastante relevância pois no costume Carajá as crianças são o bem uterino. Para iniciar o trabalho com as crianças indígenas deve-se conhecer a cultura, o costume e língua do povo.

Quando eu já me comunicava bem com as crianças, contei a elas a respeito do poder de Deus e comecei a falar sobre ressurreição. Contei que Deus é poderoso, que não há poder igual o de Deus, não há  um ser igual a Deus. Como  Carajás, eles têm medo da alma daquele que morre, pois acreditam que quando a pessoa morre, após três dias ressuscitam e voltam às casas, com isso ficam sempre atemorizados. Então falei para as crianças que após o falecimento de alguém, não precisavam ter medo do morto, porque o morto não volta. Expliquei o poder de Deus e falei que nós temos um inimigo, como eles já conheciam a história eu apenas relembrei a história do inimigo que desafiou a Deus e foi lançado no lago de fogo e que esse inimigo quer fazer de tudo para destruir o homem “para o homem ir para o lago de fogo junto de satanás e não ficar com  Deus.” 

Disse que esse é o desejo dele, que veio para matar e destruir o que Deus criou, o homem que Deus ama tanto. E aí falei que ele engana as pessoas, então quando alguém morre, ele engana fazendo com que eles ouçam barulhos e vozes para que sintam medo. Então falei que eles não precisam acreditar em fantasmas, que eles chamam na linguagem deles de uni, falei que o uni, o satanás,  os engana, fazendo barulhos, derrubando coisas… Esses são relatos que me contam  quando morre alguém, eu disse que é o inimigo das nossas almas que faz tudo isso para amedrontá-los. 

Passaram-se alguns dias e eu encontrei um menino com seus 11 anos de idade pescando lá longe no rio e sozinho na canoa. O nome dele era Melque* e eu fui até ele e falei: Melque, você está sozinho aqui no rio? Sem nenhuma companhia, nenhum amiguinho? Pescando.. você não tem medo? Quando eu falei medo eu pensei em animais peçonhentos, ou até mesmo aquele peixe piranha que corta o dedo da pessoa, de repente a pessoa pesca e pode dar um corte, esse tipo de medo. E ele me respondeu: Não, Hilda, eu não tenho medo, porque uni não existe… é satanás que quer enganar as pessoas e eu não tenho medo, porque eu creio em Deus. Achei isso muito bonito e interessante, porque ele entendeu muito bem a palavra de Deus.

*nome fictício para proteger a criança

Hilda Dias da Silveira,
missionária na Aldeia Macauba 

Esteja em oração pela vida dos missionários que atuam em aldeias indígenas para que mais crianças e adolescentes sejam livres do medo.